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quinta-feira, 25 de junho de 2009

MANIFESTO PÓRTICO (2009)

MANIFESTO PÓRTICO

‘Stamos aqui de passagem. Encruzilhada do mundo. Reencontrados no exercício da palavra dita, bem ou mal-dita para misturar imagem, movimento, ritmo e poesia; beat Rap. Transformar discurso em matéria, sem necessariamente fazer arte pela arte, obtusa, receituário. Nos convém a linguagem das ruas, quebradas, singela, prontas para perfurar o bom gosto. Pensar coletivo ao invés de individuo, da periferia ao centro. Queremos mesmo é arriscar o passo em falso do operário em Construção de Buarque de Holanda, o pregão das feiras e orixás em óleo de Carybé, os capitães de Jorge armados em prosa e lança, as pedras-cabeça de Bel Borba nas vitrines desta cidade agônica de Gregório – quão dessemelhante fora, e estais... Agora, sobretudo, não desejamos salvar o mundo, mas ao menos mover alguns moinhos, se de Quixote todos temos um pouco; utópicos remediados na palavra analgésico-comprimido para amenizar a opressão cotidiana.

‘Stamos aqui de passagem. Para desmontar fórmulas poemáticas, esquemáticas, torná-las síntese dialética entre fora e dentro, lego-linguagem destrancada das amarras gramatiqueiras: neologizar verbos, substantivos, pronomes; arquitetar novas formas de produzir arte como bem assinalou Chico Science. Não pretendemos ofuscar, criar nivelamentos, pois a música está para pintura como o mar para o firmamento. Engrossar o caldo é nosso negócio; dialogar sem salto, transitar do íntimo particular ao universal, numa mistura lírica Ferrez-Oswaldiana: subversão linguística.

Queremos mesmo que haja fogo para incendiar certezas. A morte para nos sentirmos vida. Loucura para não morrermos cegos. Sangue, paixão... Velocidade, atalho, curva; sinal fechado para quem nos relegou aos porões da história – agora reescrevemos nós mesmos nosso próprio destino, e com nossas mãos lançaremos idéias sobre o solo da juventude.

É preciso propagar literaturas, qualquer que fale ao leitor o que ele quer ouvir, seja num boteco, praça, esquina, escola. Ocupar espaços é fazer intervenções onde haja gente, sonhos, esperanças - atitude. Há quem esporre que poesia é artigo de luxo, supérfulo, algo que passamos sem. Digamos que também é o suor no rosto da rapaziada no happenig depois do trampo, as lagrimas das Terezas cansadas de guerra, a cachaça dos Martinhos das Vilas-baixadas, o pão nosso de todo dia nos trens do subúrbio, o feijão no prato de Ferreira Gullar, a iconoclastia de Ginsberg, a dialética de Marley, a utopia de Barreto, a violência estética de Glauber, o onirismo de Kurosawa, o erotismo de Hilda Hilst, a ironia de Waly Salomão.

Atenção: a poesia está no apelo dos meninos malábaris em transe-to. Está nos becos fétidos de mijo, no prazer dos casarios de amor. Está nos dedos do cego tocador de viola, nos inferninhos prisionais, no sorriso esfarelado das meninas da noite. A poesia é a porta entreaberta de Gonzaguinha. E mais: nem todo poema transa, nem todo poema fala, nem todo poema arrepia. O fazer poético é uma cama de gato, caco de vidro, goteira vinda dos telhados da nossa inconsciência ou não... Do asfalto de Drummond de Andrade. Novamente Glauber e seu Santo Guerreiro: é função do artista violentar. Por isso Stamos aqui, entre amigos, de passagem, só para compartilhar, distribuir violentamente, docemente o nosso mel melhor...

Poetas do Recital Pórtico, Junho de 2009.

Um comentário:

Vladimir Queiroz disse...

"Sempre marcando presença. Eis o destino do Pórtico. Recomeçar com um gosto de continuar.....avante!"